Posse do Presidente Benedito Cabral

A Academia Paulistana Maçônica de Letras realizou sessão solene de posse do Presidente Benedito Cabral, no dia 16 de julho, às 10 horas, na Avenida Paulista, 2001 - 13º andar, em São Paulo.
Almoço de Confraternização no Restaurante Picchi, Rua Oscar Freire, 533.

Posse Novos Acadêmicos

Álbum de Fotos do evento em comemoração aos 17 anos de fundação da Academia Paulistana Maçônica de Letras e da posse dos acadêmicos Luiz Flávio Borges D'Urso e José Maria Dias Neto.
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quarta-feira, 1 de julho de 2009

JACOB

Zeev Tuchmajer


- Oi vêi (interjeição de cansaço). A cada dia que passa esta porta de aço fica cada vez mais pesada..
- É, minha filha Hana me diz: “Papai, para que você tem que abrir a loja às 7 da manhã; por que não esperar até o João chegar para levantar esta porta pesada? Abrindo ás 8 você também não perde nada.”
-Bem, eu não perde nada, mas com certeza também não ganho nada! Além do mais: o que eu vou fazer em casa das 5 até as 8! Ler jornal? Em 5  minutos já li tudo. Chacina aqui, chacina lá; guerra aqui, guerra lá; pegaram   deputado  roubando. Qual a novidade ? É, a novidade é que pegaram ele, mas só os pequenos. Nem o Corinthians dá mais prazer de ler. Ou perde ou não ganha. Tudo cáliquer ( perna de pau). Além do mais, sempre tem as Marias que compram alguma coisinha no caminho ao emprego.
Jacob levantou a porta, pegou os cadeados, beijou a Mezuza (caixilho pequeno com um pergaminho sagrado, pregado na batente da porta) e entrou na pequena lojinha na Rua José Paulino.
Depois de acender as luzes pegou a vassoura e como tem feito nos últimos 45 anos, varreu a calçada me frente de sua loja, cantarolando algo em Idich. Aprendeu, já não lembrava de quem, que calçada limpa na frente da loja chama  freguês.
Parou na porta, olhou para o céu límpido e decidiu que hoje vai ser um bom dia. Toda a sua vida, quando estavam todos com saúde ele acreditava que o dia seria bom.
- “Entra Dona Maria, entra”, disse para uma moça que parou na porta olhando a vitrine. “A senhora ser a primeira freguesa hoje e eu fazer preço especial para abrir caixa”. Apesar de falar um português perfeito após tantos anos de Brasil, quando atendia no balcão sempre falava um português incorreto, pois sentia que as freguesas pensavam que levavam vantagem sobre ele por causa do idioma.
Um pouco antes das 8 começaram chegar os vizinhos, todos coreanos, para abrir suas próprias lojas, todos cumprimentando polidamente. Nesse pedaço de rua só sobrou ele. Alguns amigos já estão com Riboino Shel Oilam (Deus Todo Poderoso). Os outros, como Berl e Itzhak, se aposentaram e alugaram o ponto.
- Nenhum de nossos filhos  quis ser comerciante. Na verdade, nem eu quis que meus Froim, Duvid e Khana tivessem a vida dura de comerciante. Nos queríamos que nossos filhos fossem só doctoirim (médicos), advogados ou dentistas. Engraçado, os filhos dos coreanos se matam para estarem entre os primeiros no vestibular.  Na faculdade se esforçam para se graduar na elite, e depois – cada um vai e abre uma lojinha. Vai entender.

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O João chegou as quinze para as oito. Jacob entrou no banheiro. Na hora de lavar as mãos olhou no espelho. Viu um homem franzino, altura mediana, quase sem cabelos, tinha um rosto pouco enrugado mas de aparência saudável, isto apesar de seus 76 anos de idade. Sorriu para sua imagem, os olhos brilhando. Sempre acreditou que um sorriso nos lábios tornava a vida mais fácil, ainda que nem sempre mais alegre.
Às 8:01 chegou a Camila. Sempre chegava um minuto depois das oito, nunca um minuto antes das oito.
-Filha da mãe! Tenho a certeza que ela chega mais cedo no pedaço. Deve se esconder fazendo hora em algum bar por aí e entra sempre atrasada só para me afrontar. Sorte dela de eu ser bom, tolerante e considerando ela não ter pedido aumento nesse último ano, e mais importante, de ter as trompas amarradas. Licença maternidade é muito transtorno e custa caro.  
A loja tinha somente 3 metros de largura e 5 de profundidade. No fundo ficava sua escrivaninha donde dava para ele controlar o movimento e levantar rapidamente para atender fregueses quando necessário. O banheiro ficava atrás num canto. Noutro canto uma cortina pendurada servia de provador. Tinha poucas prateleiras com roupa intima feminina e para complementar algumas saias, blusas e calças.
Sentou na escrivaninha e, como toda manhã, olhou com ternura para a foto da família, tirada quando do casamento da sua neta Andréa. A sua Shaindale estava sorrindo, e parecia que era só  para ele. Não parecia que já fizera três anos desde que ela faleceu.
-Oi minha Shaindale (minha coisa linda), se você soubesse quanta falta você me faz, não teria ido antes de mim.
Lembrou quando a viu pela primeira vez, foi em 1946. Ele voltou à sua cidade natal Staszew para ver se alguém da família sobreviveu. Encontrou seu primo Leibel, e quando foi jantar com ele conheceu a cunhada desse, a Shaindale. Um a moça frágil, cabelo negro, olhos negros grandes -olhos de quem passou muita fome – braços finos nos quais o número tatuado ficou ressaltado. Foi compaixão que depois de conhecê-la melhor virou paixão.
-Shaindale, cuide de nos todos aqui em baixo até o dia de nos encontrarmos novamente.
Lá pelas nove horas a Khana ligou para saber se estava tudo bem com ele.
Abriu a pastinha e retirou os cheques a serem depositados no dia. Olhou um por um.
-Este aqui esta me cheirando à tchvok ( um caloteiro). Não sei por que fui vender para ele apesar de meu nariz me indicar não fazê-lo. Bem, espero que eu esteja errado.
“João, vai ao banco e depois de fazer os pagamentos e depósitos me tira o saldo.”

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“Senhor Jacó, não quer que eu passe no balcão para ver se tem cheque devolvido?”
“Vira esta boca para lá! Cheque devolvido! ‘Tá bom João, dê uma olhada, mas rapidinha.”
Um pouco antes do meio dia entrou na loja um rapaz vestindo um terno e com uma pasta de couro novinha na mão. Dirigiu se até a Camila, lhe disse algo e está apontou para o Jacob.
-Um Khaper (fiscal)! Estou cheirando um Khaper - e logo já foi se curvando um pouquinho fazendo uma cara triste e abatida.
“O senhor é o proprietário da loja ?”
“Quem quer saber ?”
“Eu sou da Secretária da Fazenda do Estado” e já foi tirando do bolso interno do paletó o documento que o identificava.
“Em que posso ajudá-lo Sr ?....Sr. ?.....”
“Meu nome é Dr. Francisco Alves Figueira e eu fui designado para fiscalizar a sua empresa. E o senhor é ?..  ”
- Olha ele, olha como fala! Aqui no Brasil qualquer shmendrik (pivete) é logo um D-o-u–t–o–r.
“Dr. Figueira, primeiro não vamos exagerar, empreeesa. Empresa é Petrobrás, Light, Volkswagen. Eu só tenho uma pequena lojinha. Eu sou Jacob Cohen.” 
“Bem Sr. Jacob, eu vou precisar dos livros fiscais. Quem é o seu contador ?”
Depois de fazer o termo de abertura e de pegar o endereço do contador, despediu-se dizendo que vai voltar em uma semana.
O Jacob ligou imediatamente para o seu contador, e quando este atendeu: “Flávio, aqui é o Jacob Cohen. Tem um fiscal indo para ai pegar os meus livros. Fala para ele que eu sou muito velho, pobre e doente e vê logo se ele quebra galho.”
Apesar de já ter a experiência de passar por muitas fiscalizações, foi uma semana de agonia. Dormiu mal, comeu pouco, pois com fiscal - especialmente um que parecia ter começado na Secretaria recentemente – a coisa podia ficar feia.
Na quarta feira, no meio da manhã, eis que aparece o fiscal. O Jacob pensou logo: Mal sinal, quarta feira não é um dia de sorte. Se fosse terça ou quinta.....
“Como vai Dr.,....ehhhh.....Dr.?”
“Francisco” respondeu o fiscal.
“Dr. Francisco, Dr. Francisco, é isso. Então, tudo em ordem? Vai assinar os livros?”
“Um minutinho, Sr. Jacob. Há uma discrepância entre o que apurei nos livros e o que vejo na loja. Assim à primeira vista devia ter muito mais mercadoria. O Sr. Podia explicar?”

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“Discrep... oooo que?”
“Discrepância, diferença, os números não batem.”
“Eu não entendo. Eu trabalho tudo ceeeem  per cento. Compra tudo com nota, vende tudo com nota.”
“Bem. Então vamos fazer um levantamento.”
“Para que levantamento Doutor,vamos perder tempo. Enquanto faz levantamento - eu não vendo; o governo deixa de ganhar impostos. O senhor sabe, eu sou velho e já não enxergo tão bem. Ás vezes as freguesa rouba e eu não consigo ver. Vem muita mercadoria com defeito e eu dou para caridade. Claro que vai faltar mercadoria.”
“Mas esta mercadoria também tem que tirar nota”, disse o fiscal.
“O senhor quer que eu dar nota para ladrão!?”
“Sr. Jacob, claro que não, mas para instituições de caridade, sim.”
“Ah, eu não sabia! Agora eu já sei, obrigado.” Disse Jacob.
“Sr. Jacob, infelizmente eu vou ter que aplicar uma multa.”
“Dr. Francisco, para que multa? Não da para dar um jeitinho?”
“Sr. Jacob, o senhor sonegou, dinheiro este que vai para escolas, saúde e outras coisas.”
“Dr. Francisco, eu não soneguei. Eu só peguei antecipado o que o governo me deve.”
“Como, o que o governo lhe deve. É o senhor que deve ao governo.”
“Dr. Francisco, o senhor sabe quanto tempo demora o governo devolver impostos, haa? O senhor não disse que o governo dá o dinheiro para escola e saúde? Então, eu vou dar dinheiro ao governo. Depois o governo tem que devolver para mim para a escola de meus filhos e netos. Aí eu pensei: para que todo este trabalho? Eu pego o dinheiro e pago sozinho a escola. A mesma coisa com a saúde. Eu pago sozinho o plano de saúde. È menos papelada, menos trabalho para o governo, menos funcionários. O governo faz economia e eu não preciso esperar anos para governo devolver o meu dinheiro para pagar educação e saúde. Eu não soneguei, só adiantei a minha parte!”
“Sr. Jacob, mas não é assim que funciona! Imagina se cada cidadão fizer a mesma coisa. Vai faltar dinheiro para o governo.”
“Dr. Francisco, não é o senhor não, mas se desperdiça (rouba) muito dinheiro no governo (tudo ladrão). Então, se tem menos dinheiro, desperdiça (rouba) menos. Olha doutor., eu tenho 76 anos e quero trabalhar. Eu não sou empresa mas dou trabalho para duas pessoas – registradas! O senhor quer dar multa, o senhor pode. Mas, então..... aqui esta a chave da loja. Eu vou embora e deixo para o governo pagar Camila e João. Já estou ficando muito cansado mesmo.”
“Sr. Jacob, eu vou estudar o caso e volto amanhã.”
“Doutor, para que estudar? o senhor já é doutor. O senhor já sabe tudo!”

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“Ah, meu Deus, o senhor não está facilitando para mim. Está bem, está bem Sr. Jacob. Vou aplicar uma multa pequena; alguma coisa vou ter que multar, mesmo que só simbólica. O Sr. sabe, para mostrar serviço lá na Secretária. Vou mandar o ofício ao seu contador. Adeus Sr. Jacob.”.
“Muito obrigado, Dr. Francisco! Muuuito obrigado!!! O senhor é muito bom. Deus o Abençoe.”
O Dr. Francisco vai em direção à porta da loja.
Correndo para a porta atrás do fiscal: “Dr. Francisco, Dr. Francisco!”
O Dr. Francisco virando com surpresa: “Sim, Sr. Jacob?”.
“Quando chegar Natal, o senhor passa aqui que eu dou presente para sua esposa e para sua filha. Ta bom?”
O Dr. Francisco abre um sorriso e diz: “Não precisa, Sr. Jacob, mas muito obrigado assim mesmo. Adeus”.
“Deus que o conserve, Dr. Francisco”. (looonge de mim!).
Mais um Khaper (fiscal) superado. Graças a Deus!Deus me ajude nunca mais ver um novamente até o resto da minha vida!!! Amem! Mas, se precisar, vamos começar tudo de novo! Oi vei.


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